terça-feira, 12 de junho de 2007

Meu PC e eu, um relacionamento íntimo


Postado pela aluna: Amanda de O. Vasti do curso de Pedagogia / 3º ano

Computadores coloridos do Projeto Cybersocial: um dos trabalhos desenvolvidos pelo Metareciclagem

O que faz você se sentir à vontade com o computador que usa? Afinal, depois que passamos a usar esta máquina, ela vira parte de nossa rotina. E como em qualquer outra relação que se prolongue, acabamos criando laços de intimidade com o PC. Aliás, a sigla PC, para quem nunca procurou saber, significa Personal Computer (nome inglês para "computador pessoal"). Eu, por exemplo, me sinto tão, mas tão ligada aos computadores que uso (o do trabalho e o de casa), que chego a conversar com as máquinas. Quando ele resolve emperrar, faço carinho no monitor (Ok, é estranho. Mas é melhor do que dar socos na máquina, não?).
Brincadeiras à parte, o uso diário de um PC, seja para trabalhar, estudar ou se divertir, leva-nos a criar maneiras de sentir que ele é nosso, nem que seja somente naqueles minutos em que o usamos. Aqui na redação, por exemplo, temos um festival de "bichinhos" sobre os monitores. Cada um coloca um bibelô de que gosta em cima do PC para torná-lo mais seu, mais parte do seu dia-a-dia. Hoje mesmo, peguei um de nossos artistas aqui da redação colando uma letra do seu nome no monitor. Também é comum se colocar uma foto ou uma ilustração com a qual simpatiza na área de trabalho. Eu tenho a foto de um cubo mágico na minha. Em cima do meu monitor, tenho uma mini-múmia.
Essas identidades que a gente cria são também um caminho para a apropriação da tecnologia em um sentido mais amplo. Afinal, retomando o que disse no início do texto, sentir-se à vontade com a máquina é se sentir mais livre para conhecê-la, explorá-la, manuseá-la. Hoje conversei com um rapaz que faz parte de um grupo magnífico que desconstrói e reconstrói a tecnologia. Em uma das várias ações que eles desenvolvem, crianças de comunidades carentes participam de oficinas onde computadores usados (frutos de doações) são desmontados para que suas peças sirvam para montar novas máquinas. Se houver peças que não funcionem, ganham outro destino. "Nós as descaracterizamos", conta Felipe Fonseca, o rapaz com quem falei. "A placa mãe de um computador pode virar capa de agenda, a placa de memória, um chaveiro. Até obras de arte nós criamos", conta. Felipe é pesquisador de Tecnologia da Informação e faz parte do grupo Metareciclagem, que propõe a rearticulação da tecnologia como uma maneira de apropriação social deste conhecimento.
Fiquei impressionada com o trabalho do Felipe – e de mais de 200 pessoas espalhadas pelo Brasil. O Metareciclagem não é uma organização não-governamental, mas um grupo de pessoas que, por meio de uma lista de discussão na internet, divide conhecimentos e etapas de um trabalho presencial onde se incentiva a sociedade a manipular a tecnologia até sentir-se dona desta linguagem. "Trabalhamos muito com projetos comunitários e sociais, onde sempre buscamos preparar as pessoas para que tenham autonomia e continuem o processo de desconstrução e reconstrução da tecnologia sem precisar de ajuda", diz Felipe. "Quando a peça ou um computador não serve para mais nada, nem para virar peça de outras máquinas, descartamos em empresas que façam o processo limpo de reciclagem". Acima de tudo, o grupo propõe a replicação do conhecimento, que é fazer com que os participantes se sintam intimamente ligados às máquinas.
Essa aproximação dos usuários com seus PCs no Metareciclagem transcende a idéia de se ter uma foto legal na área de trabalho ou um boneco em cima do monitor. A favor do uso de softwares livres – programas e aplicativos que não estão condicionados a compra e venda e podem ser baixados da internet gratuitamente – e do manuseio livre dos computadores, o grupo orienta as escolas a parar de trancar as salas de informática. "Há uma certa resistência das escolas nesse aspecto, talvez porque tenhamos um discurso muito livre", observa Felipe. Ele conta um caso interessantíssimo do quanto as crianças podem se sentir participantes da linguagem tecnológica. Em um laboratório montado em Santo André (SP), parte dos computadores era pintada e outra parte tinha a cor tradicional, bege. Acontece que as crianças pediam licença para usar os beges, mas nem pestanejavam na hora de usar os coloridos. "Quando pintamos as máquinas, tiramos dela aquela cara de dispositivo eletrônico e damos uma visão mais lúdica. As crianças perdem o medo de usá-la", conta Felipe.
A apropriação da tecnologia, para Felipe e para o grupo Metareciclagem vai ainda além de tudo isso. Eles acreditam que a criança (e todo mundo) devem "entender a chave de fenda como um acesso ao portal do conhecimento". "O computador é uma série de descobertas tecnológicas reunidas", diz Felipe. "Tratamos de cada váriável dentro dele, como a placa de som, que é usada para ouvir o som dos vídeos no Youtube e também pode ser usada para transformar um velho walkman em transmissor de rádio", explica. Esse é apenas um exemplo do trabalho que o Metareciclagem faz. Deu para perceber que se apropriar da tecnologia não é apenas aprender a digitar e usar a internet. E sim, conhecer todas as ligações internas de uma máquina e aprender uma série de outras coisas com elas. Quem participa da Metareciclagem? Inúmeros perfis: professores, educadores, consultores de marketing, desenvolvedores de softwares, artistas plásticos e pessoas que vêem a tecnologia como uma linguagem social.


Reportagem por Débora Didonê (repórter)

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