Executivos, giz e lousa!
Gumercindo Pereira Carvalho
Crescente preocupação das empresas em desenvolver seus funcionários reforça novo mercado para pedagogos Pergunte a qualquer executivo qual o principal fator que pode levar uma empresa ao sucesso. A resposta será única: gente. Desde o início dos anos 90, as organizações passaram a perceber e a valorizar o capital humano como seu principal recurso, capaz de garantir a perenidade de uma companhia em tempos de competição acirrada e mudanças constantes. A atenção por esse contingente de pessoas é tão grande que pode ser medida pelo resultado de recente pesquisa da consultoria Deloitte Touche Tohmatsu com 93 empresas no Brasil: 87,6% delas têm como prioridade investir nas áreas de treinamento e desenvolvimento de seus colaboradores.
Vale notar que esse universo pesquisado soma mais de meio milhão de empregados e faturamento superior a R$ 100 bilhões. São empresas de grande porte que demonstram o interesse na aprendizagem contínua, traço marcante da chamada gestão por competências, que tem por princípio o gerenciamento e desenvolvimento da carreira a partir das habilidades adquiridas e aplicadas ao dia-a-dia corporativo.
Consultor e diretor da Manager Consultoria, empresa especializada em recursos humanos (RH), José Antônio Rosa reforça a existência desse mercado e o papel estratégico da educação no mundo empresarial. Para ele, com a evolução e a aplicação constante do conhecimento nas organizações, quem não se desenvolve no trabalho fica pouco competitivo. E a empresa também. "A organização, na verdade, tem uma demanda de conhecimento muito grande e tende a prover vários públicos dessa 'matéria-prima': os funcionários, para serem mais eficientes; seus fornecedores, para manter a qualidade no produto final; e também seus clientes, até mesmo para fidelizar a compra", explica.
Com esse papel, há quem admita que cada vez mais a empresa está se tornando uma escola, como acredita Eduardo Najjar, diretor da Transformo, consultoria em educação corporativa. "Nela, legitimamente, você aprende e aplica. Mas para que a área responsável pelas pessoas possa exercer essa função, é preciso um arcabouço pedagógico", observa Najjar, aproximando, assim, RH e pedagogia. "A preocupação com o desenvolvimento das pessoas existente nos profissionais oriundos das faculdades de educação é um ponto positivo para sua atuação na área", reforça Gladys Zrncevich, vice-presidente da Korn/Ferry, empresa multinacional de hunting, atividade de busca de profissionais no mercado para as mais diversas áreas.
Mas o que pode fazer, exatamente, um pedagogo no meio de uma empresa? José Emídio Teixeira, gerente de educação e relações sociais da Rhodia, destaca, num primeiro momento, a liderança e a organização de processos de capacitação. "Ele pode levar para o campo empresarial a questão metodológica, que, na minha opinião, é pouco desenvolvida", conta. Outras formas de atuação encaixam-se nos processos de relacionamento interpessoal e na transmissão da cultura da empresa, crenças e valores, para todos os funcionários.
Universidade corporativa - Nesse novo cenário construído pela educação corporativa começam a surgir em ritmo crescente as iniciativas de inúmeras empresas em formatar verdadeiras instituições de ensino para lidar com esses objetivos. São as chamadas universidades corporativas que, na opinião do pedagogo e consultor de RH Luiz Carlos Moreno, estão se tornando parte significativa do sistema nacional de educação. "Na realidade, as organizações privadas cada vez mais se fortalecem como parte do sistema educacional do país. Assim, desenvolvem seus próprios cursos e currículos, empregam pessoal docente e administrativo, usam sistematicamente sofisticados recursos auxiliares de ensino e avaliam seus próprios programas e métodos. Conclusão: o pedagogo é o profissional mais qualificado para conceber, planejar, desenvolver e administrar essas atividades", comenta.
Antes, porém, de se implantar uma universidade dessa natureza, os responsáveis pelo projeto, entre eles o próprio profissional de educação envolvido, devem verificar se a liderança da organização, a partir do presidente, compreendeu e vai participar como o primeiro interessado naquilo que vai se transformar em uma nova forma de pensar dentro da empresa. "Esse processo exige uma mudança na cultura organizacional, na qual o erro deve ser entendido como ponto de partida para o aprendizado. Desse modo, não adianta criar uma universidade corporativa se continuar existindo, na organização, um estilo autoritário de gestão, que certamente não está alinhado com esse conceito", alerta Cássio Cury Mattos, presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH).
Se as empresas acordaram para a educação, o caminho inverso ainda não está sedimentado. Esse campo de atuação para o pedagogo não parece ser vislumbrado pelas faculdades de educação de forma geral. "Os cursos são mais instrumentais, centrados na carreira do magistério e da administração escolar", critica Luiz Carlos. O mesmo desinteresse é percebido por Najjar, que revela ter sido procurado, recentemente, por alunas de graduação em pedagogia: "Percebi que elas tinham interesse em atuar no mundo corporativo, mas o curso não oferecia base para isso, ao contrário do curso de psicologia, por exemplo, que possui formação nas áreas clínica e organizacional."
Uma das exceções dessa regra parece ser a Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP). De acordo com o professor Romualdo de Oliveira, o currículo da instituição possui uma certa flexibilidade que permite ao futuro pedagogo direcionar sua formação para a área que mais desejar. "Nosso curso é de quatro anos. Metade das disciplinas são obrigatórias e aproximadamente um terço das outras são optativas, de tal maneira que o aluno define sua grade curricular. Isso possibilita diversos tipos de inserção no mercado", explica.
Oliveira observa que vários alunos de pedagogia da USP já possuem cursos de graduação em outras áreas, trabalham na área de recursos humanos e buscam, na educação, complementar sua formação para as necessidades que a atividade exige. E foi esse caminho, inverso, que José Emídio Teixeira, Luiz Carlos Moreno e Mitsu Sugimoto Araújo percorreram.
Há cinco anos trabalhando na Natura como responsável pelo núcleo de aprendizagem da empresa, Mitsu começou sua carreira em recursos humanos na Rhodia, há 20 anos. "Na época eu cursava artes plásticas. Mas me apaixonei pela área de RH e redirecionei minha formação", lembra. Após o curso de pedagogia, ela continuou nesse campo: fez mestrado em educação, tendo aulas com Paulo Freire, o que a marcou positivamente para sua carreira na empresa. "Ele sempre dizia que não se treina pessoas, animais é que são adestrados. Devemos desenvolver o ser humano. Essa é a nossa preocupação em RH", destaca.
Necessidades - Luiz Carlos Moreno iniciou sua carreira em segurança do trabalho. Apesar de possuir uma formação técnica, começou a perceber que os melhores resultados com os equipamentos de segurança eram obtidos por meio de atividades de ensino junto aos trabalhadores. "Posteriormente, fui promovido para o departamento de treinamento e desenvolvimento, onde descobri minhas carências de referencias teóricas", conta. A saída era buscar essa complementação. "Vale ressaltar, no entanto, que o curso de pedagogia não supriu todas as minhas necessidades, mas possibilitou muita coisa. Tive de negociar com cada professor meu interesse na educação de adultos", recorda-se.
Por não ter uma formação específica para atuar no mundo das empresas, o pedagogo deve buscar algumas competências para melhor se adaptar nesse campo. Gladys aconselha uma dedicação especial para conhecer como funciona o ambiente organizacional e o segmento de negócios da empresa em que pretende trabalhar. Além disso, outras habilidades em moda nas empresas também devem ser trabalhadas, como capacidade de realização, compromisso com resultados, criatividade e inovação, pensamento estratégico e trabalho em equipe.
Integrado na missão do RH moderno, também chamado de estratégico, o pedagogo pode contribuir para o sucesso de uma empresa. "Os líderes, em qualquer nível, são responsáveis pelo sucesso ou fracasso da organização. E a melhor forma de liderar é ensinar", explica Cury Mattos, da ABRH, reforçando que o vínculo da pedagogia com a empresa está no papel da liderança. "Se criarmos uma organização com o valor daquela que aprende, onde as pessoas exercem o papel de donos de seu processo, todos assumirão o papel de líderes. Por dominar essa metodologia, a pedagogia transforma-se no combustível desse processo. É daí que vamos obter maior eficácia do aumento de produtividade", finaliza.
Gumercindo Pereira Carvalho
Crescente preocupação das empresas em desenvolver seus funcionários reforça novo mercado para pedagogos Pergunte a qualquer executivo qual o principal fator que pode levar uma empresa ao sucesso. A resposta será única: gente. Desde o início dos anos 90, as organizações passaram a perceber e a valorizar o capital humano como seu principal recurso, capaz de garantir a perenidade de uma companhia em tempos de competição acirrada e mudanças constantes. A atenção por esse contingente de pessoas é tão grande que pode ser medida pelo resultado de recente pesquisa da consultoria Deloitte Touche Tohmatsu com 93 empresas no Brasil: 87,6% delas têm como prioridade investir nas áreas de treinamento e desenvolvimento de seus colaboradores.
Vale notar que esse universo pesquisado soma mais de meio milhão de empregados e faturamento superior a R$ 100 bilhões. São empresas de grande porte que demonstram o interesse na aprendizagem contínua, traço marcante da chamada gestão por competências, que tem por princípio o gerenciamento e desenvolvimento da carreira a partir das habilidades adquiridas e aplicadas ao dia-a-dia corporativo.
Consultor e diretor da Manager Consultoria, empresa especializada em recursos humanos (RH), José Antônio Rosa reforça a existência desse mercado e o papel estratégico da educação no mundo empresarial. Para ele, com a evolução e a aplicação constante do conhecimento nas organizações, quem não se desenvolve no trabalho fica pouco competitivo. E a empresa também. "A organização, na verdade, tem uma demanda de conhecimento muito grande e tende a prover vários públicos dessa 'matéria-prima': os funcionários, para serem mais eficientes; seus fornecedores, para manter a qualidade no produto final; e também seus clientes, até mesmo para fidelizar a compra", explica.
Com esse papel, há quem admita que cada vez mais a empresa está se tornando uma escola, como acredita Eduardo Najjar, diretor da Transformo, consultoria em educação corporativa. "Nela, legitimamente, você aprende e aplica. Mas para que a área responsável pelas pessoas possa exercer essa função, é preciso um arcabouço pedagógico", observa Najjar, aproximando, assim, RH e pedagogia. "A preocupação com o desenvolvimento das pessoas existente nos profissionais oriundos das faculdades de educação é um ponto positivo para sua atuação na área", reforça Gladys Zrncevich, vice-presidente da Korn/Ferry, empresa multinacional de hunting, atividade de busca de profissionais no mercado para as mais diversas áreas.
Mas o que pode fazer, exatamente, um pedagogo no meio de uma empresa? José Emídio Teixeira, gerente de educação e relações sociais da Rhodia, destaca, num primeiro momento, a liderança e a organização de processos de capacitação. "Ele pode levar para o campo empresarial a questão metodológica, que, na minha opinião, é pouco desenvolvida", conta. Outras formas de atuação encaixam-se nos processos de relacionamento interpessoal e na transmissão da cultura da empresa, crenças e valores, para todos os funcionários.
Universidade corporativa - Nesse novo cenário construído pela educação corporativa começam a surgir em ritmo crescente as iniciativas de inúmeras empresas em formatar verdadeiras instituições de ensino para lidar com esses objetivos. São as chamadas universidades corporativas que, na opinião do pedagogo e consultor de RH Luiz Carlos Moreno, estão se tornando parte significativa do sistema nacional de educação. "Na realidade, as organizações privadas cada vez mais se fortalecem como parte do sistema educacional do país. Assim, desenvolvem seus próprios cursos e currículos, empregam pessoal docente e administrativo, usam sistematicamente sofisticados recursos auxiliares de ensino e avaliam seus próprios programas e métodos. Conclusão: o pedagogo é o profissional mais qualificado para conceber, planejar, desenvolver e administrar essas atividades", comenta.
Antes, porém, de se implantar uma universidade dessa natureza, os responsáveis pelo projeto, entre eles o próprio profissional de educação envolvido, devem verificar se a liderança da organização, a partir do presidente, compreendeu e vai participar como o primeiro interessado naquilo que vai se transformar em uma nova forma de pensar dentro da empresa. "Esse processo exige uma mudança na cultura organizacional, na qual o erro deve ser entendido como ponto de partida para o aprendizado. Desse modo, não adianta criar uma universidade corporativa se continuar existindo, na organização, um estilo autoritário de gestão, que certamente não está alinhado com esse conceito", alerta Cássio Cury Mattos, presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH).
Se as empresas acordaram para a educação, o caminho inverso ainda não está sedimentado. Esse campo de atuação para o pedagogo não parece ser vislumbrado pelas faculdades de educação de forma geral. "Os cursos são mais instrumentais, centrados na carreira do magistério e da administração escolar", critica Luiz Carlos. O mesmo desinteresse é percebido por Najjar, que revela ter sido procurado, recentemente, por alunas de graduação em pedagogia: "Percebi que elas tinham interesse em atuar no mundo corporativo, mas o curso não oferecia base para isso, ao contrário do curso de psicologia, por exemplo, que possui formação nas áreas clínica e organizacional."
Uma das exceções dessa regra parece ser a Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP). De acordo com o professor Romualdo de Oliveira, o currículo da instituição possui uma certa flexibilidade que permite ao futuro pedagogo direcionar sua formação para a área que mais desejar. "Nosso curso é de quatro anos. Metade das disciplinas são obrigatórias e aproximadamente um terço das outras são optativas, de tal maneira que o aluno define sua grade curricular. Isso possibilita diversos tipos de inserção no mercado", explica.
Oliveira observa que vários alunos de pedagogia da USP já possuem cursos de graduação em outras áreas, trabalham na área de recursos humanos e buscam, na educação, complementar sua formação para as necessidades que a atividade exige. E foi esse caminho, inverso, que José Emídio Teixeira, Luiz Carlos Moreno e Mitsu Sugimoto Araújo percorreram.
Há cinco anos trabalhando na Natura como responsável pelo núcleo de aprendizagem da empresa, Mitsu começou sua carreira em recursos humanos na Rhodia, há 20 anos. "Na época eu cursava artes plásticas. Mas me apaixonei pela área de RH e redirecionei minha formação", lembra. Após o curso de pedagogia, ela continuou nesse campo: fez mestrado em educação, tendo aulas com Paulo Freire, o que a marcou positivamente para sua carreira na empresa. "Ele sempre dizia que não se treina pessoas, animais é que são adestrados. Devemos desenvolver o ser humano. Essa é a nossa preocupação em RH", destaca.
Necessidades - Luiz Carlos Moreno iniciou sua carreira em segurança do trabalho. Apesar de possuir uma formação técnica, começou a perceber que os melhores resultados com os equipamentos de segurança eram obtidos por meio de atividades de ensino junto aos trabalhadores. "Posteriormente, fui promovido para o departamento de treinamento e desenvolvimento, onde descobri minhas carências de referencias teóricas", conta. A saída era buscar essa complementação. "Vale ressaltar, no entanto, que o curso de pedagogia não supriu todas as minhas necessidades, mas possibilitou muita coisa. Tive de negociar com cada professor meu interesse na educação de adultos", recorda-se.
Por não ter uma formação específica para atuar no mundo das empresas, o pedagogo deve buscar algumas competências para melhor se adaptar nesse campo. Gladys aconselha uma dedicação especial para conhecer como funciona o ambiente organizacional e o segmento de negócios da empresa em que pretende trabalhar. Além disso, outras habilidades em moda nas empresas também devem ser trabalhadas, como capacidade de realização, compromisso com resultados, criatividade e inovação, pensamento estratégico e trabalho em equipe.
Integrado na missão do RH moderno, também chamado de estratégico, o pedagogo pode contribuir para o sucesso de uma empresa. "Os líderes, em qualquer nível, são responsáveis pelo sucesso ou fracasso da organização. E a melhor forma de liderar é ensinar", explica Cury Mattos, da ABRH, reforçando que o vínculo da pedagogia com a empresa está no papel da liderança. "Se criarmos uma organização com o valor daquela que aprende, onde as pessoas exercem o papel de donos de seu processo, todos assumirão o papel de líderes. Por dominar essa metodologia, a pedagogia transforma-se no combustível desse processo. É daí que vamos obter maior eficácia do aumento de produtividade", finaliza.
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